Quem acompanha política e economia sabe bem do
grande desafio de qualquer governo em manter sob controle a inflação enquanto
tenta lidar com outras questões econômicas e sociais, isso se deve pelas
eventuais contradições e conflitos entre o que se entende que deve ser feito em
determinada resolução de um problema com o que deve ser feito para estabilizar
a depreciação ou valorização monetária.
Deixando mais fácil de se entender podemos citar alguns exemplos, em um
governo que está se endividando devido a consecutivos rombos nas contas
públicas em função de uma arrecadação inferior aos gastos públicos, nesse
cenário desconsiderando a questão da inflação esse governo teria duas opções, a
primeira; ou ele corta gastos de forma austera para a arrecadação conseguir
suprir os gastos que restarem ou, a segunda; ele cria um pacote de estímulos
por meio de investimentos e queda de juros, atrelado a uma tributação um pouco
mais elevada que embora aumentaria fortemente a dívida pública num primeiro
momento iria aquecer a economia e consequentemente turbinar a arrecadação no
longo prazo, além de que com os juros estando baixos fora o objetivo principal
que é fazer fluir o crédito privado, faz a dívida pública também gerar menos
prejuízo com a sua rolagem de pagamentos de juros para os detentores de seus
títulos, permitindo equilibrar as contas. Ainda desconsiderando a questão da
inflação podemos concluir que a melhor decisão entre essas duas medidas depende
da situação social e especulativa da sociedade, num cenário que o mercado já está
aquecido e pulsante e que a população ou pelo menos a maior parte dela não se
encontra em uma situação de vulnerabilidade social o governo deveria optar pela
primeira alternativa e cortar gastos, tirando investimentos em obras públicas,
assistencialismo, contratações e ajustes eloquentes no funcionalismo público
etc, a segunda opção até pode ser funcional mas pode acarretar bolhas
especulativas diante da valorização desproporcional de algum nicho de mercado e
a tributação tiraria a competitividade internacional e exigia um continuo e não
sustentável aumento de consumo interno para manter o crescimento. Já diante de
um cenário de desemprego forte, desabastecimento de produtos essenciais,
colapso dos sistemas de saúde e abastecimento de água e energia elétrica aí
sim, naturalmente a segunda opção se torna a melhor. Mas e se introduzirmos
agora a relevância da questão de controlar a inflação, bom se existir deflação
que nada mais é que a inflação negativa, onde a melhor opção seria a primeira
ou seja, a economia está indo relativamente bem e o povo está com um modo de
vida bem estruturado, ocorre uma contradição pois o corte de gastos públicos
traria ainda mais deflação por desvalorizar nichos de mercado diretamente
afetados por esses recursos, a desvalorização de determinados investimentos faz
que quem detém o capital fique mais receoso de colocar ele em circulação por
meio de novos e diferentes investimentos e prefira optar por ficar na segurança
que a moeda parada lhe trás e assim a valorizando, criando um potencial
desencadeamento de crise econômica ao invés de apenas equilibrar a balança de
gastos e arrecadação, na atualidade isso ocorre em muitos países europeus como,
Espanha, Grécia, Bulgária etc, por outro lado se ocorre inflação galopante em
um país onde o segunda opção é a melhor não só existe um potencial mas a
certeza que se for implementado a injeção de investimentos e cortes de juros a
desvalorização da moeda ou seja, a inflação irá aumentar muito uma vez que
todos querem se desfazer de suas reservas de moeda em busca de investir e
usufruir dos retornos da economia aquecida, gerando assim um movimento de, o
que se compra hoje com um valor não vai conseguir mais comprar amanhã, quase
imparável, exemplo disso está ocorrendo na Turquia, e mesmo quando pelo menos
no que diz respeito aos juros, esses não caem e com isso acabam por se tornar
uma alternativa de retorno a alguns investidores privados para não colocarem
todo seu capital em circulação, se mostra ineficiente ao impedir a força
inflacionária se houver investimento públicos seja de qual for a natureza no
mercado, e o pior com os juros mantidos altos é eliminado também qualquer
vantagem que se conseguiria anteriormente para equilibrar as contas, drama que
Argentina e Venezuela sofrem amargamente na atualidade.
Como
pode ser percebido o controle da inflação por ir na contra-mão, impede em
muitos se não na maioria dos casos a aplicação das medidas de ajuste fiscal
mais coerentes com a realidade que se faz presente nos países, casos que
demandam cortes para equilibrar as contas precisam de manutenção de gastos para
combate a deflação e casos que demandam investimentos para atender a
necessidades em muito justificáveis e aumentar a arrecadação acabam precisando
de cortes austeros muitas vezes desumanos para com a população carente para
impedir a inflação descontrolada. Mesmo quando o ajuste fiscal não se faz
necessário como nos exemplos citados até aqui, muitas outras medidas que visam
alcançar interesses nacionais dos mais variados precisam ser adiados,
repensados e até mesmo cancelados pela necessidade de não desestabilizar a
inflação na economia.
Uma
oportunidade de se desfazer desse fardo que é a continua manutenção do valor
monetário que muitas vezes a mera sinalização equivocada por parte do governo e
demais autoridades traz grandes consequências cambiais, deveria ser agarrada
com todas as forças e geraria um grande potencial de inovação da administração
pública devido ao desengessamento de planos ambiciosos e políticas econômicas
mais coerentes com a real necessidade da sociedade.
Seria
possível essa árdua função ser transferida? Pode ser que sim, através da
tecnologia do blockchain e o que orbita seu universo. Para explicar isso
preciso destacar que não me refiro ao Bitcoin ou qualquer outra criptomoeda de
destaque atual pois essas não contem lastro algum, são descentralizadas e mesmo
quando detém algum lastro ou centralização tem força menor que a força
especulativa que move o valor monetário que representam como verdadeiras
montanhas russas nos gráficos das exchanges mundo a fora, fazendo essas
"moedas" que mais parecem apenas ser ativos especulativos ou até
mesmo não exagerando chamar de apostas de cassino, serem buscadas de forma
seria apenas em países que o risco e a alta volatilidade que as criptomoedas detém
garantem mais segurança que as moedas tradicionais locais que devido a inflação
estratosférica garante desvalorização. Afinal, melhor arriscar e ter chance de
não perder o valor das suas reservas do que ter a garantia que irá perder!
Muitos que estiverem lendo o conteúdo até aqui e já terem tido algum
contato com esse tema vão ter uma reação de estranheza pois, outros influencers
defensores dessa tecnologia argumentam com majoritária concordância que quanto
mais descentralizada é a criptomoeda melhor ela é. Bom, eu não concordo e vejo
como prova dessa visão estar equivocada, como essas criptomoedas não tem no seu
principal emprego a função de moeda corrente para facilitar trocas e compras de
bens e serviços, mas apenas na busca por lucro em operações especulativas e em
reserva de valor em países devastados pela inflação descontrolada. Tido isso
posso explicar e defender como essa tecnologia usada da forma idealizada por
mim poderia ser a responsável por terceirizar o trabalho do governo de
controlar a inflação.
Primeiramente vamos aos pontos que uma criptomoeda baseada em uma rede
blockchain tem a ganhar sendo estruturada de for institucional em um país, a
blockchain tem a inovação de usar os próprios usuários e mineradores para
sustentar a rede descentralizada em funcionamento mas ela é lenta para validar
as transações e cobra taxas de uso de rede que quando o valor da criptomoeda
esta alta inviabiliza seu uso no varejo, com o uso em conjunto de servidores
centralizados dedicados a essa finalidade traria um custo, velocidade e
estabilidade muito mais viável a essa rede e a sua descentralização se tornaria
algo complementar para impedir falhas, o emprego institucional traria também
uma força de padronização e aceitação ao mercado para com essa tecnologia e
possibilitaria os recursos necessários para garantir por fora um controle sobre
as distorções cambiais iniciais em relação as moedas tradicionais no mercado.
Agora, os pontos e vantagens que um governo tem a ganhar em usar essa
tecnologia, se utilizando da grande independência que um código contendo todos
os algoritmos de funcionamento que ao ser finalizado se torna inalterado o
governo entregaria ao mercado uma segurança que faz parecer os atualmente
arrojados projetos de independência via PECs(Propostas de Emendas à
Constituição) dos bancos centrais ao redor do mundo absolutamente obsoletos, já
que qualquer influência não só política mas também pessoal dos ocupantes das
diretorias dos bancos centrais estaria impossibilitada, além de total
independência o que iria vir nesses algoritmos estabelecidos inicialmente
também abre um leque enorme de vantagens como atrelar o valor da moeda a uma média
ou outro cálculo baseado em uma lista e inclusive padrões eletivos para
substituição automática de partes dessa lista, de valores de elementos distintos
como, preços dos commodities, cotações de moedas tradicionais e índices
nacionais de consumo, desenvolvimento, superávits, ocupação populacional, etc.
Podendo assim como os bancos centrais tentam muitas vezes fazer com as taxas de
juros e compulsório ineficientemente devido ao retardo das ações diante das
necessidades, ter ajustes, e graças aos algoritmos todos automáticos, rápidos,
técnicos e ai sim eficientes claro, ocorrendo a manutenção de valor para caso
ocorra por exemplo, baseado nos dados da própria rede blockchain a detecção de
depreciação ou valorização indesejada da criptomoeda, ajustes esses como, uma
destruição ou emissão de moedas em porcentagens equivalentes a quantidades de
quem as detém dentro de suas reservas, isso em um primeiro momento causaria
bastante eufórica ou ira aos leigos que presenciariam seu dinheiro se
multiplicando ou se degradando dentro das suas contas ou carteiras virtuais,
mas rapidamente após o entendimento do ajuste tal seria uma âncora de
estabilidade que garantiria o valor atrelado ao que foi estabelecido mantido
pois as correções seriam pequenas e poucos comuns, pequenas porque ocorreriam
com rapidez e exatidão de acordo como se fazem necessárias e sendo assim
discretas porém suficientes, e poucos comuns devido a que a própria noção que
isso ocorre em si já é um tipo de lastro.
Com
um cenário sem a preocupação com atuar pensando na inflação os bancos centrais
poderiam atuar com suas medias focando em outras frentes, mais voltadas para
fiscalização e para fomentar a economia em setores específicos que se fazem
necessárias e em conjuntos a projetos do governo coerentes e menos engessados.
A
implementação de um projeto desse deveria ser feito com muita seriedade e
expertise visando jamais precisar tentar refundar a moeda com outro código e
diferentes algoritmos afinal a solidez da vantagem residiria justamente na
inexistência do dever, mas também no direto por parte do governo e seja qual for
a autoridade, de influenciar novamente nessa questão. Mesmo com essa grande responsabilidade
inicial, e com todas as dores de cabeça que sua instalação e substituição da
moeda tradicional em circulação, qualquer pais deveria considerar essa
proposta, a inflação já destruiu muitas economias ao longo da história e mesmo
as que não foram destruídas por ela ainda estão a sombra desse risco e
carregando cicatrizes terríveis como gerações inteiras de seu povo que
nasceram, cresceram e morreram vivendo em crises e sem possibilidade de brilhar
enquanto seus países se debatiam para afastar o problema, isso só até a próxima
rodada de crise voltar.